Archive for janeiro, 2016

Conselhão: mais espuma do que animação da economia

Fala-se que Dilma vai reativar o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), conhecido como Conselhão. O objetivo seria restabelecer o diálogo com a sociedade e buscar saídas para a crise. A presidente teria convidado pessoas de destaque – banqueiros, empresários, executivos e líderes sindicais – para integrar o CDES.
O Conselhão foi criado por Lula em 2003, no seu primeiro mandato. Chegou-se a falar, na época, em colher sugestões para negociar um pacto social nos moldes dos Pactos de Moncloa, que permitiram à Espanha enfrentar a crise do fim dos anos 1970 e completar a transição para a democracia.
Na realidade, o Conselhão tornou-se palco para o marketing político e para gerar a impressão de que o setor privado contribuía para formular propostas para resolver problemas do país.
O CDES se inspirou nos pactos sociais europeus posteriores à Segunda Guerra, que de fato contribuíram para lidar com os desafios da integração econômica. Acontece que eles refletiam condições sociais, culturais e institucionais inexistentes no Brasil. Ocorreram em sociedades caracterizadas por estruturas que asseguravam efetiva representatividade aos participantes e aceitação de suas cláusulas pelos representados.
A reativação do Conselhão vai gerar notícia. Será local para discursos oficiais que prometem uma inviável recuperação da economia no curto prazo. Dificilmente mudará para melhor as expectativas. Animar a economia depende mais de ações que restaurem a confiança de empresários e consumidores do que de aplausos e oportunidades para fotografias. Não veremos ideias com chances de se tornar realidade.

Ideias loucas para uso das reservas internacionais

A desinformação costuma ser fonte de propostas econômicas sem fundamento. A mais recente é a ideia de utilizar as reservas internacionais para ajudar Estados e municípios a enfrentar sua grave crise financeira ou para realizar investimentos de infraestrutura. Isso não faz o menor sentido. Está certo o ministro da Fazenda em rejeitar a proposta.

Há muitas razões para descartar a ideia, mas aqui vão as que me parecem as principais:
1) as reservas estão fora do país, em moeda estrangeira, aplicadas geralmente em títulos emitidos por governos ou organizações multilaterais. Os gastos seriam feitos em moeda local, isto é, em reais. Como resolver o problema?
2) o Banco Central teria que vender reservas no mercado local, recebendo reais em troca. Acontece que o BC não pode fazer empréstimos a instituições não-financeiras, como Estados, municípios ou concessionários de serviços de infraestrutura. Aí começa a complicar. Como fazer?
3) A solução seria o BC usar os recursos para comprar papéis do Tesouro no mercado secundário. A operação abriria espaço para o Tesouro emitir novos títulos no mercado primário. o Tesouro poderia entregar os recursos ao BNDES, para que este os emprestasse. Nova complicação: o Tesouro despejou R$ 500 bilhões no banco para a concessão de empréstimos subsidiados, o que criou muitos problemas. O governo se comprometeu a suspender essa operação. Recomeçaria tudo, arriscando-se a perder mais credibilidade? Como sair dessa?
4) Uma saída seria o governo propor ao Congresso a abertura de crédito adicional do Orçamento para ajudar Estados e municípios ou financiar obras de infraestrutura. A fonte de recursos seriam os recursos decorrentes da emissão de novos títulos. E como eles iriam para o setor público? Empréstimos a Estados e municípios ou simples dotação a fundo perdido? Mais complicação;

Se nada disso bastasse, a coisa mais louca seria a própria venda das reservas no mercado local. Isso criaria pelo menos três problemas:
a) a venda das reservas no mercado local acarretaria uma valorização da moeda nacional. O dólar ficaria relativamente mais barato, o que reduziria a competividade da indústria. O governo estaria destruindo uma das raras fontes de recuperação da economia nesta grave situação. Além disso, o dólar mais barato estimularia fugas de capital, inclusive porque a louca medida emitiria um mal sinal de política econômica. No segundo momento, a fuga provocaria desvalorização, gerando pressão inflacionária. A indústria ganharia, mas o mal sinal desestimularia as empresas a buscar mercados de exportação. Além da volatilidade, quem confiaria em um governo que adota medida tão louca?
c) as reservas constituem uma espécie de seguro neste momento de crise. Elas têm contribuído para evitar fugas de capitais. Sua redução, traria novas perdas de confiança e fugas de capital, com suas correspondentes consequências.

Custa a crer que ainda tem gente capaz de abraçar ideia tão estapafúrdia como a venda de reservas internacionais para financiar gastos em reais.

Limite para a carga tributária: poucas chances de passar

Segundo o jornal Valor de hoje, a CCJ da Câmara aprovou a admissibilidade, sob o ponto de vista constitucional, de proposta, atribuída a Eduardo Cunha, de limitar a carga tributária do país (União, Estados e municípios) a 25% do PIB. A ideia, equivocada, ecoa visões muito comuns entre empresários, de que a queda da carga tributária impulsionaria o crescimento da economia, pois reduziria o “custo Brasil”. Há três erros elementares na proposta;

1) O custo da carga tributária para as empresas tem a ver essencialmente com as obrigações derivadas do confuso regime tributário brasileiro. Empresa, uma ficção jurídica, não paga imposto. Serve para cobrá-los de consumidores, sócios e acionistas e detentores de riqueza. No Brasil, impostos se incorporam ao custo de produção pela impossibilidade de sua desoneração nas exportações ou de transferência aos preços. Reduzir a carga tributária não resolve esse problema;
2) Os países nórdicos da Europa, que costumam ser campeões nos rankings de competitividade, têm carga tributária variando entre 40% e 50% do PIB. O que importa é o desenho da carga e não o seu nível, que pode ser elevado quando interfere pouco na eficiência da economia;
3) É impossível ajustar as despesas ao limite de 25% do PIB em dez anos, como diz o projeto. Três grupos de despesas obrigatórias – Previdência, pessoal e encargos financeiros da dívida – superam o limite proposto para a carga tributária. Não há como reduzi-los nas próximas décadas. Vale lembrar que outras despesas igualmente obrigatórias – educação e saúde – levam facilmente o total dos gastos a superar os 30% do PIB.

Diante de tudo isso, são baixas as chances de aprovação final da proposta de estabelecer o limite para a carga tributária. A CCJ da Câmara não entrou no mérito, limitando-se a examinar se o projeto fere dispositivos da Constituição. Não fere. Tudo indica, todavia, que a proposta será arquivada no exame do mérito em outras comissões, quando devem prevalecer argumentos racionais determinantes de seu arquivamento. enhum país estabeleceu teto para a carga tributária. Simplesmente porque não faz nenhum sentido.