BC continua assumindo riscos excessivos (ao contrário do que pensei)
Como muitos, impressionei-me com o discurso feito em Washington pelo presidente do BC, no último dia 15. Ele reiterou o compromisso com a estabilidade monetária e disse que ainda estávamos no meio do ciclo de política monetária. O discurso foi capa de todos os grandes jornais no dia seguiinte. Eu embarquei na onda e incluí um novo comentário neste blog, assinalando que havia uma reserva de racionalidade no BC. Puro engano. Já na segunda-feira, uma “fonte” do governo na mesma cidade americana informava que todos tinham feito uma leitura errada do discurso de Alexandre Tombini. Mandou que se lesse novamente o Relatório de Inflação, no qual as autoridades monetárias se mostravam pouco preocupadas com o ritmo da inflação e se diziam convencidas de já terem adotado as medidas necessárias (afirmação da qual discorda a maioria dos analistas, inclusive este escriba)
A decisão do Comitê de Política Monetária da última quarta-feira veio mostrar que a “fonte” estava correta. O BC continua firme nas suas crenças. Ao contrário do que esperavam todas as consultorias e muitos bancos – uma elevação de 50 pontos na taxa Selic – o Copom subiu apenas 25 pontos. Em vez de reagir com rigor à evidente aceleração da inflação, reduziu o ritmo de ajuste da Selic. Alegou incertezas do cenário internacional e sobre o ritmo da atividade econômica doméstica. Nem ligou para a inequívoca deterioração das expectativas. Parece dar razão a analistas e gente do governo, para os quais essa deterioração esconderia um estratagema do mercado financeiro para forçar a subida dos juros. Isso é pura bobagem, como assinalou Affonso Pastore no seu excelente artigo de hoje no Estadão, mas é aceita por muitos, inclusive alguns acadêmicos, como se existisse um ser celeste que coordenasse as ações desse suposto cartel.
Seja como for, é surpreendente a ação do BC. Dá a impressão de que perdeu a autonomia construída a duras penas nos últimos 20 anos e se atrelou às visões “desenvolvimentistas” da Fazenda. Sinaliza que prefere mirar uma taxa mínima de crescimento do PIB, mesmo sob o risco de não cumprir a meta para a inflação deste ano, de 4.5%. A propósito, se confirmada a projeção da Tendências para o IPCA em 2001, a meta foi para o brejo. A estimativa foi revista recentemente para 6,6% (o limite superior da meta é 6,5%). O risco é o de ampliação do grau de indexação, tornando a inflação rígida para baixo. O próprio governo contribui para isso, pois já fixou o nível de reajuste do salário mínimo do próximo ano, que deverá ficar em 14%. O custo de recuperar a credibilidade do BC e fazer a inflação convergir de novo para a meta seria enorme. Pode resultar em baixo crescimento em 2011 e 2012. E se o governo, particularmente o Ministério da Fazenda, reagir mal a essa realidade, como tem feito ultimamente, um novo risco pode surgir, agora para o governo: o de perda das eleições presidenciais de 2014, que para Lula não existe. Segundo ele, Dilma vai ser reeleita e o PT ficará pelo menos 20 anos no poder.
Na ata da reunião do Copom, a ser divulgada na próxima quinta-feira, o BC deve dizer por que age assim. Pode confirmar a percepção de que trilha um caminho temerário. Ou convencer a maioria dos analistas de que o erro é deles. Torçamos para que o BC esteja correto.