Tombini mostra que a racionalidade ainda habita o Banco Central

No seu discurso de ontem em Washington, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, disse que o ciclo de política monetária está no meio, reafirmando o compromisso de fazer a inflação convergir para a meta de 4,5% em 2012. A declaração vai reverter o sentimento de que o BC estaria assumindo, perigosamente, riscos inflacionários, o que começava a afetar sua credibilidade. Imaginava-se que Tombini estaria alinhado (ou até submetido) às visões “desenvolvimentistas” da Fazenda. A “nova política monetária” era festejada por economistas de esquerda. A ênfase, aparentemente excessiva, nas chamadas “medidas macroprudenciais” mereceu as boas vindas de respeitados analistas. Conhecidos economistas do mercado financeiro apoiavam a “nova postura” do BC. A maioria estava, todavia, do outro lado, temendo a destruição das conquistas institucionais dos últimos vinte anos, incluindo um sério abalo na imagem de responsabilidade e competência angariada pelo BC.

O sentimento negativo por parte dessa maioria se acentuou após a divulgação do último Relatório de Inflação, no qual o BC parecia adotar premissas polêmicas. Dizia que o choque de commodities seria passageiro, que a atividade econômica dava sinais de arrefecimento e que já havia adotado as medidas necessárias. Seria apenas uma questão de tempo e paciência. Este escriba e a maior parte dos analistas tinham visões opostas. O choque de commodities tende a durar, movido pela demanda da China; ainda não há sinais claros de desaceleração da atividade econômica; e seria preciso prosseguir o ciclo de política monetária.

O BC começou a perder a batalha das expectativas, fruto da dificuldade de leitura de seus sinais por muitos analistas. A impressão era a de que o comando das ações havia passado para a Fazenda. As confusas e diárias entrevistas do ministro Guido Mantega contribuíam para agravar a sensação de que a situação poderia desandar. A meta de inflação poderia ser perdida em 2011. Nesse ambiente, as projeções dos principais indicadores macroeconômicos, particularmente inflação e juros, começaram a exibir grande dispersão. A interpretação era a de que o BC interromperia prematuramente o ciclo de política monetária. Poderia no máximo aumentar a taxa de juros (Selic) mais uma vez, em 50 pontos base, na reunião do Comitê de Política Monetária da próxima semana.

Não precisava ser economista para constatar que a inflação se tornava uma ameaça. O assunto havia saído dos recintos especializados para a boca do povo. Óbvio, se o pior acontecesse, haveria uma reserva de racionalidade no BC e no governo, que os obrigaria a reagir, mas a um custo alto. A taxa de juros teria que subir muito. O governo Dilma poderia ter jogado fora seu capital inicial de credibilidade e terminar seu período enfrentando queda de popularidade e dificuldades políticas. Aumentariam as chances de a oposição se refazer de seu marasmo e buscar vencer as eleições de 2014.

As declarações de Tombini vão na direção contrária ao sentimento que se espalhava. Nesta segunda-feira, os mercados futuros devem sinalizar juros mais altos, enquanto os analistas tenderão a rever suas projeções de elevação da Selic. A meu ver, passarão a dizer é que a Selic vai aumentar 50 pontos na próxima semana e pelo menos mais 50 pontos na reunião seguinte. Tombini trouxe um alívio e pode começar a desfazer as impressões que já circulavam, de que não teria liderança para se contrapor às visões da Fazenda, como fizera Meirelles com o apoio de Lula. Melhor assim.

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