Uma pauta desastrosa
O imposto sobre grandes fortunas é injustificável
Cobrar tributos dos mais ricos, ainda que justificável em certas circunstâncias, tem sido o objetivo de partidos de esquerda em todo o mundo. Já a criação de um imposto sobre grandes fortunas (IGF) exerce um fascínio especial. Não há igual ímpeto, todavia, em estudar suas consequências, mesmo porque a ideia tem o apoio dos menos informados, que não enxergam seus maus efeitos. É assim também com a direita desatenta aos seus impactos desastrosos sobre a poupança, o investimento e o ânimo de investir e assumir riscos, que são essenciais para expandir a economia, a renda e o emprego.
Roberto Campos Neto estudou os efeitos desastrosos do IGF e apontou a inconveniência da medida em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo (1/11/2025). Ele relacionou sete armadilhas do imposto, entre as quais a de desencorajar a criação de riqueza. Vale, a propósito, mencionar a visão do notório comunista chinês Deng Xiaoping (1904-1997). Ao ascender ao poder, com 74 anos, ele promoveu uma grande virada de valores e políticas públicas, que asseguraram a ascensão da China, ainda que preservando a ideologia do autoritarismo.
Deng se deu conta do desastre do ideal comunista do controle dos meios de produção pelo Estado e da relevância dos incentivos e da economia de mercado para impulsionar o desenvolvimento. Na missão de liderar as mudanças que guindariam seu país ao posto de segunda economia do mundo, ele fez uma declaração impressionante: “enriquecer é glorioso”. Foi o oposto do que decidir criar o IGF.
Em países da América Latina e até nos desenvolvidos da Europa, segmentos atrasados da esquerda pugnam pela redução da pobreza com apoio em forte tributação dos ricos, sem imaginar que a extração excessiva pode prejudicar o crescimento ao reduzir a formação de capital, a inovação e a produtividade. As políticas de Deng e seus sucessores retiraram mais de 800 milhões de chineses da pobreza. Por aqui, segundo afirmou com precisão o chefe do governo espanhol, Felipe González, “a esquerda latino-americana gosta tanto de pobres que tudo faz para multiplicá-los”
Agradeço a Isaías Coelho, um dos nossos melhores especialistas em tributação, que chefiou a divisão de assuntos tributários do FMI, por me fornecer os dados das nações que desistiram do IGF e das que ainda os mantêm, que uso a seguir. Dos anos 1950 em diante, 24 países criaram o imposto, incluindo ricos como Alemanha, Áustria, Espanha, Itália, Japão, Luxemburgo e Suécia. Acontece que o imposto é difícil de fiscalizar. Os custos de arrecadação podem superar a receita. Contribuintes migraram para outros países, fugindo dessa incidência tributária. Hoje, apenas nove países ainda mantêm o IGF: Argentina, Bolívia, Colômbia, Alemanha, França, Holanda, Noruega, Suíça e Uruguai. Não será surpresa se alguns estiverem examinando sua eliminação.
Quando o Congresso examinar a regulamentação do IGF, cumprindo decisão do STF, deveria considerar a literatura que recomenda sua rejeição.
Publicado em VEJA de 21 de novembro de 2025, edição nº 2971
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