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Economia

18 de nov de 2015 , 21h14

Ruim com a CPMF, pior sem ela

Ruim com a CPMF, pior sem ela

É positiva a resistência da sociedade à proposta de restaurar por quatro anos a CPMF para arrecadar anualmente 32 bilhões de reais. Levada ao extremo, todavia, essa reação terá custos maiores do que os do tributo. Infelizmente, a CPMF – com ou sem Dilma – é indispensável.

Desde 1989, quando ela surgiu sob o rótulo enganoso de imposto único, eu me oponho publicamente à tributação de transações financeiras. Reconheço, no entanto, que a ideia é recomendável temporariamente em crises fiscais como a atual, que inclui a queda de receita. Não há espaço para novo e relevante corte de gastos.

De fato, as despesas obrigatórias do Orçamento da União – mais de 90% do total – atingiram nível absurdo e insustentável. Abrangem Previdência, pessoal, educação, saúde e encargos da dívida. A margem efetiva de manobra talvez não chegue a 5%, pois certas despesas, mesmo que não obrigatórias, são necessárias.

É difícil evitar gastos mínimos com conservação de infraestrutura, custeio administrativo e programas sociais, como os voltados para os segmentos menos favorecidos. O Bolsa Família auxilia 14 milhões de famílias pobres, ampara 50 milhões de beneficiários e custa apenas 0,5% do PIB.

Diz-se, corretamente, que ajustes fiscais via corte de gastos restauram mais rapidamente o crescimento. Há bons exemplos mundo afora. Ocorre que nenhum país tem a rigidez orçamentária do Brasil, efeito da marcha da insensatez iniciada em 1983. Na Constituição de 1988, pensou-se que velhas desigualdades seriam resolvidas a golpes de gastos sociais.

Os grandes favorecidos foram funcionários públicos e idosos, contemplados com benefícios insustentáveis. Mais tarde, aumentos reais de mais de 150% no salário mínimo – que reajusta três quartos dos benefícios do INSS – pioraram a situação.

Os gastos previdenciários subiram de 4% do PIB, em 1987, para 12% atualmente. Como o PIB dobrou no período, tais despesas, descontada a inflação, aumentaram seis vezes. O déficit do INSS para 2016, de 125 bilhões (2% do PIB), é o maior rombo da República. Afora isso, não dá para mexer nas vinculações de tributos a despesas de educação e saúde. E, se o serviço da dívida não for pago, destrói-se o crédito do Tesouro.

Há que fixar idade mínima para aposentadoria, mas seus resultados viriam apenas ao longo de trinta anos. Devem-se ainda abolir as vinculações, o que implica enfrentar e vencer fortes corporações e tempo para reestruturar os respectivos programas.

O esforço fiscal para fazer o ajuste em 2016 supera 120 bilhões de reais. Não dá para realizá-lo somente pelo corte de despesa. Para o economista Mansueto Almeida, se fosse possível cortar o Minha Casa, Minha Vida, o Pronatec e o Ciência sem Fronteira, seriam economizados 21 bilhões de reais. E 85% do custeio da máquina administrativa tem a ver com cinco funções sociais, entre as quais o Bolsa Família, o seguro-desemprego e o abono salarial. Difícil, não?
Muito pode ser feito para racionalizar gastos e promover mudanças estruturais. Dilma deveria começar o processo, embora sejam pequenas as chances de aprovação, pois isso exige liderança política, competência e tempo, condições hoje não disponíveis. A enrascada é grande e foi agravada nos governos do PT.

A CPMF seria uma ponte até que se criassem as condições para restabelecer a viabilidade orçamentária. Enquanto isso, seriam evitados o descontrole da relação entre a dívida e o PIB e o agravamento da atual crise. Para impedir a perpetuação da CPMF, a eventual prorrogação seria condicionada a um plebiscito.

Valeria elevar a Cide, taxa cobrada da gasolina e do diesel, para 60 centavos de real. É um tributo de melhor qualidade, mas sua arrecadação, de 15 bilhões de reais ao ano, não resolveria o problema. Quem sabe o governo recorra aos dois.

Há quem tema o uso dos recursos para gastar mais e eleger Lula. A manobra, suicida, seria imediatamente percebida pelos mercados. Faria cair ainda mais a confiança e enterraria de vez as chances do PT em 2018.
Se pensar em si e no país, a oposição deveria apoiar a CPMF, a menos que queira herdar em 2019, se chegar ao poder, como é provável, os escombros de uma monstruosa crise fiscal. Os mais pobres terão pago o maior preço. Não será pequeno o custo da reconstrução.

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