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8 de fev de 2014 , 15h46

Previdência: o rombo de mais de R$ dez trilhões

Previdência: o rombo de mais de R$ dez trilhões

Todos os meses se informa o déficit bilionário do INSS. A soma em 2013 atingiu R$ 49,9 bilhões. O déficit com os funcionários federais foi maior: R$ 63,5 bilhões. Os dois perfizeram R$ 113,4 bilhões, mais do que o dobro dos investimentos (R$ 52,5 bilhões) e quase cinco vezes o custo do Bolsa Família (R$ 24 bilhões). Já é hora de prestar atenção a outro rombo, tão preocupante mas pouco conhecido: a dívida atuarial da Previdência, que supera R$ 10 trilhões.
Há dois tipos de desequilíbrio previdenciário. O primeiro, o déficit de caixa, é o que nos informam mensalmente. É a diferença entre a arrecadação de contribuições e o que se paga de benefícios. O segundo, a dívida atuarial, tem a ver com os compromissos futuros em relação aos aposentados, aos pensionistas e aos que se aposentarão.
Expliquemos. Suponha um país sem aposentados, onde as contribuições não cobrem as aposentadorias e pensões futuras. Haverá superávit de caixa, pois entram recursos e não há benefícios a pagar. Existirá, no entanto, uma dívida atuarial, pois a arrecadação não será suficiente para resgatar os compromissos futuros.
Um sistema previdenciário é equilibrado se não há dívida atuarial. As contribuições cobrem as despesas atuais e futuras. Essa não é a situação comum no mundo. O Brasil se destaca por exibir os dois tipos de desequilíbrio, o de caixa e o atuarial, ambos expressivos e insustentáveis. O sistema americano entrará em déficit de caixa em 2033. O brasileiro chegou lá quase quarenta anos antes. Há déficit de caixa desde 1995.
Em 2007, cinco economistas brasileiros estimaram a nossa dívida atuarial: 1,93 vezes o PIB de 2005 (Impacto de reformas paramétricas na Previdência Social brasileira: simulações alternativas, texto para discussão nº 1289, Ipea). Desde então, sem reforma e com déficits de caixa, o rombo passa facilmente de dois PIBs. Dada a estimativa de R$ 5,2 trilhões para o PIB de 2014, R$ 10 trilhões são um cálculo muito conservador para a dívida atuarial.
A maioria dos regimes previdenciários nasceu na primeira metade do século XX, inclusive o brasileiro. Todos adotaram o regime de repartição simples, pelo qual os trabalhadores de hoje contribuem para custear as aposentadorias dos trabalhadores de ontem. Acontece que a expectativa de vida aumentou e a taxa de natalidade diminuiu. Proporcionalmente, há cada vez mais aposentados e menos trabalhadores. Esse descompasso gera a dívida atuarial.
A situação fica muito mais grave se não foram acumuladas reservas quando “sobrava dinheiro”. No Brasil, as sobras foram gastas na construção de Brasília e atividades semelhantes. A Constituição de 1988 piorou a situação ao ampliar o universo dos aposentados que nunca contribuíram. De 1995 para cá, o salário mínimo tem subido acima da inflação. Seu valor, que reajusta 40% do montante dos benefícios, teve aumento real de 174,3%. Os gastos do INSS saltaram de 2,5% do PIB em 1988 para 7,5% do PIB em 2013. O PIB cresceu 91,2% no período.
Ademais, o Brasil adota tratamento generoso para as pensões por morte. Os dependentes herdam 100% da aposentadoria, em partes iguais, o que significa um aumento da renda per capita da família. Em outros países, a pensão por morte considera o tempo de contribuição do segurado, se há filhos e sua idade, e se o cônjuge sobrevivente tem condições de trabalhar. Aqui, a generosidade estimula o casamento de jovens com idosos para herdar uma pensão que será mantida por muitos anos, mesmo que ela ou ele se case novamente. O custo das pensões por morte é de 3% do PIB Supera os gastos previdenciários totais da Coreia do Sul, de menos de 2% do PIB.
Ao longo dos anos, o Congresso acentuou os desequilíbrios com aposentadorias especiais para certas categorias e outras medidas. Agora, examina a revogação do fator previdenciário. Adotado em vários países, o fator ajusta o valor das aposentadorias considerando o aumento da expectativa de sobrevida do segurado. A revogação seria uma enorme irresponsabilidade.
O sistema previdenciário é uma bomba-relógio que se agrava com as mudanças demográficas. Sem reformas, deixaremos um legado terrível para as futuras gerações.

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