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Política

2 de dez de 2009 , 11h51

Pré-sal: os riscos de gestão

Pré-sal: os riscos de gestão

Semana passada, assinalei as inconveniências do regime de partilha, a ser adotado na exploração do petróleo e do gás. Será abandonado o regime de concessão, em que o governo licita os blocos e cobra royalties e participações especiais. Nesse modelo, é baixo o potencial de corrupção, de captura de reguladores e de desperdícios.

É difícil entender por que se renunciaria a um regime que é mais seguro, testado como padrão de países de instituições confiáveis, por outro dirigista e pleno de riscos. As justificativas oficiais – defender-nos da cobiça internacional, controlar o ritmo de produção e considerar o caráter “estratégico” do petróleo – não são convincentes.

Diz o governo que os riscos da exploração do pré-sal caíram. O regime de partilha garantiria maior volume de recursos ao setor público. O argumento é procedente, mas a conclusão é falsa. Sob igual justificativa, o regime de concessão permite obter os mesmos recursos mediante simples alteração do decreto de participação.

Restam a ideologia e a motivação eleitoral para explicar a mudança. Na primeira, seus autores acreditariam que o pré-sal geraria mais benefícios sob o comando de burocratas. Na segunda, se exploraria a visão pró-estado, majoritária na sociedade, em favor de candidaturas oficiais. Quem se opuser é “entreguista”.

O Fundo Social, que acolherá os recursos atribuídos à União, contém elevados riscos de gestão. Na Noruega, país que melhor conduz esse tipo de atividade, os recursos integram um fundo soberano no Ministério da Fazenda, que delega sua administração ao Banco Central e este contrata profissionais do mercado financeiro.

O princípio básico que orienta seu uso é vedar o esbanjamento pela atual geração. Os recursos constituem uma espécie de fundo de pensão. Daí o seu nome, Government Pension Fund. O orçamento público recebe apenas os rendimentos das aplicações, o que reserva os benefícios da riqueza do petróleo para as gerações futuras.

O Fundo Social nada tem de norueguês. Será na prática um orçamento paralelo. O Congresso aprova as dotações globais, mas as prioridades e a gestão cabem ao Executivo, que decidirá sobre a política de investimentos e a destinação dos recursos para educação, saúde, tecnologia, meio-ambiente e assim por diante.

O poder efetivo estará no Comitê de Gestão Financeira e no Conselho Deliberativo, cuja composição, competência e funcionamento serão fixados pelo Executivo. Do Conselho participarão servidores públicos e “representantes da sociedade civil” e não, como era hábito, pessoas de “ilibada reputação e notório saber econômico e financeiro”.

O relator do projeto, deputado Antonio Palocci, reduziu o potencial de desperdícios. Por seu substitutivo, apenas os rendimentos das aplicações, à la Noruega, poderão ser utilizados a cada ano. Mesmo assim, a porta fica aberta para o uso presente e indiscriminado dos recursos.

Como está posto, o Fundo Social terá baixíssima transparência e reduzida ou nenhuma participação do Legislativo na definição de suas prioridades. Grande parte dos gastos será feita pelos governos da hora. Estará criado o ambiente para a excessiva valorização cambial, o oposto do que assegurou o governo ao encaminhar o projeto de lei.

Além disso, ao concentrar sua atenção na mudança do regime, o governo parece não ter-se preparado para enfrentar a poderosa coalizão dos governadores. Tudo indica que vai perder essa batalha e concordar com transferências maiores, mais gastos locais e mais valorização cambial. A situação não seria a mesma com o regime de concessão.

Assim, afora os efeitos negativos do regime de partilha em si, poderemos ter uma piora do regime fiscal. Seria a repetição do que ocorreu com as transferências da Constituição de 1988. Os estados e municípios terão mais dinheiro para ampliar os gastos correntes. O setor público diminuirá a já limitada capacidade de investir. O país perderá.

Ao examinar os projetos a toque de caixa, o Congresso não enxerga os seus riscos. Aprova práticas centralistas típicas do regime militar, delega poderes excessivos ao Executivo e atende interesses políticos do momento. A conta irá para nossos netos, bisnetos e trinetos.

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