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Política

25 de mar de 2007 , 18h40

Porteira aberta

Porteira aberta

Diante da recente reforma ministerial e da luta por cargos no governo, valeria indagar se seria o caso de utilizar uma empresa de recrutamento de pessoal para a escolha dos titulares do segundo escalão. Por exemplo, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda seria por ela selecionado de forma aberta e por mérito.

É assim que o age governo britânico, como se viu de anúncio na The Economist (10/3/2007). Uma empresa privada ajudará a escolher o diretor do Departamento de Política Macroeconômica e Fiscal do Ministério da Fazenda (Her Majesty Treasury). O escolhido será também o economista-chefe do governo, coordenando o trabalho de mais de mil economistas em cerca de trinta departamentos e agências governamentais.

No Brasil, o Departamento Administrativo do Serviço Público – DASP, surgido nos anos 1930, foi uma tentativa de criar uma burocracia estável e competente. Infelizmente, muitas décadas e reformas depois, continuamos escolhendo assessores e dirigentes por critérios políticos. Na União, mais de vinte mil cargos podem ser preenchidos dessa forma.

No governo Lula, a situação piorou. O critério de competência nem sempre foi o mais relevante. Nos escândalos como os do mensalão e do dossiê contra candidatos tucanos nas últimas eleições, vimos que entre os envolvidos estavam detentores de cargos públicos designados mais por sua militância do que por mérito.

Na escolha dos novos ministros de Lula, apareceu uma expressão típica dos negócios agropecuários. Teria prevalecido o critério de “porteira fechada”, isto é, os cargos na sua pasta lhes pertencem. Poderão indicar amigos e correligionários sem ater-se à sua competência. O Planalto nega, mas se for outro o critério a situação dificilmente mudará.

No serviço público britânico, o primeiro-ministro pode nomear pouco mais de cem pessoas, incluindo os ministros. O restante é escolhido exclusivamente pelo critério de mérito e em muitos casos com a utilização de empresas especializadas. Essa tradição foi iniciada no primeiro dos quatro períodos em que William Gladstone exerceu o cargo de primeiro ministro (1868-1874).

Gladstone é tido como o maior político britânico do século 19. A ele se credita a criação de uma burocracia que passou a funcionar sem a influência de grupos de interesse, particularmente os das classes mais altas. A base foi um relatório de 1854, cujo principal autor, Sir Charles Trevelyan, ficara famoso como investigador de casos de corrupção na Índia, onde servira por 14 anos. A ideia era evitar a repetição no Reino Unido.

O relatório defendia a instituição de uma burocracia permanente e recomendava a eliminação das indicações políticas na escolha de servidores. Haveria critérios distintos para selecionar funcionários para tarefas rotineiras e para as de maior responsabilidade. Neste último caso, a escolha deveria levar em conta basicamente os dotes intelectuais em geral e não conhecimentos específicos dos selecionados.

A burocracia britânica inspirou a adoção de serviços semelhantes em outros países e seu legado ajudou no desenvolvimento de ex-colônias, como foram os casos de Cingapura e Hong Kong. Atualmente, o processo de escolha de dirigentes recrutados fora da carreira do serviço público conta com a participação dos Civil Service Comissioners, designados pela Coroa (não são funcionários nem subordinados a ministros).

Caso o leitor se interesse em conhecer os princípios e as regras para a escolha de dirigentes públicos no Reino Unido, poderá acessar o site dos comissioners (http://www.civilservicecommissioners.gov.uk), clicando depois em publications e Civil Service Comissioner’s Recruitment Code.

Estamos longe do grau de desenvolvimento alcançado pelos britânicos no recrutamento e na seleção de servidores, mas poderíamos começar a tentar. Uma ideia seria estabelecer que a escolha de dirigentes deveria recair em funcionários de carreira. Ainda que isso representasse uma reserva de mercado, seria melhor do que a situação atual. Mais tarde, se pensaria em escolhê-los pelo mesmo método adotados pelas empresas privadas para selecionar seus executivos. Cargos como os de presidente da Petrobrás, do Banco do Brasil e outros seriam preenchidos com o auxílio de head hunters. Não custa nada sonhar.

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