Política
22 de abr de 2015 , 15h12Por uma revolução nas empresas estatais
A Seattle Public Utilities (SPU), empresa de serviços públicos dessa cidade americana, recorreu ao LinkedIn para selecionar um diretor da área de saneamento. O anúncio está no endereço www.linkedin.com/jobs2/view/26951605. O LinkedIn é um popular site de relacionamento profissional utilizado por executivos e técnicos que buscam expandir sua rede de contatos e explorar novas oportunidades de trabalho.
A forma competitiva para escolher dirigentes do setor público, inclusive empresas estatais, vigora em países anglo-saxônicos desde o século XIX. Para nomear o seu atual presidente, o Banco da Inglaterra, por exemplo, veiculou anúncio na revista The Economist. Escolheu um canadense. Outros países avançados fazem o mesmo. A corrupção sistêmica do petrolão não existiria se os diretores da Petrobras tivessem sido nomeados desse modo.
Empresas estatais surgiram na Europa no século XIX sob políticas de industrialização que incluíam proteção à indústria nascente. Foram criados bancos, empresas de transporte ferroviário e outras nas quais o mercado não pudesse suprir os respectivos bens e serviços. Depois da II Guerra, empresas privadas foram estatizadas sob o argumento de que eram estratégicas ou que deveriam funcionar sem a motivação do lucro. Nos anos 1980, esse modelo fracassou e se promoveu ampla privatização.
Empresas estatais continuam a existir no mundo rico, caso da norueguesa Statoil. Mesmo que não sejam sociedades por ações, entidades como a SPU atuam nos Estados Unidos em serviços públicos, transporte ferroviário (como a federal Amtrack), crédito para segmentos não atrativos ao setor privado e outros.
No Japão, na restauração da dinastia Meiji (1868), adotou-se uma política de industrialização distinta da ênfase europeia ao protecionismo. Recorreu-se a subsídios, apoio via compras governamentais e criação de empresas estatais. No fim do século XIX, as empresas foram privatizadas, remanescendo por certo tempo a de aço, então tida como estrategicamente relevante.
Em geral, nos países ricos as estatais nasceram de políticas de desenvolvimento ou para prover serviços essenciais sem se submeter aos padrões rígidos da administração direta, que prevalece nas finanças públicas, na segurança, no Legislativo, no Judiciário e em áreas voltadas para a educação. Incorporou-se na origem a ideia de que tais empresas deveriam adotar métodos privados de gestão, inclusive na escolha de dirigentes.
Nas regiões de tradição ibérica, como aqui, a criação de estatais ocorreu em ambiente cultural menos favorável aos negócios privados. Aos objetivos legítimos de industrialização juntou-se a visão de mundo do patrimonialismo e do capitalismo de Estado ou de compadrio. Seus diretores são substituídos a cada novo governo – o que costuma acarretar descontinuidades –, e sua escolha é comumente feita por critérios políticos.
Sem bons mecanismos de governança e de escolha de dirigentes, um desastre como o da Petrobras terminaria por acontecer. Era mera questão de tempo. Imagine o tamanho da rapinagem se a Vale, a Embraer, as empresas siderúrgicas e as de telecomunicações ainda fossem estatais.
Muitos apostam na privatização como defesa contra o câncer que se espalhou na Petrobras. Pode ser, mas não há ambiente social para tanto. A medida ainda vai requerer mudanças culturais profundas, que levam tempo e educação para acontecer.
Embora tampouco viável neste governo, vale começar a refletir sobre outra saída: revolucionar a gestão das estatais, na linha dos países ricos. O Congresso aprovaria o Estatuto das Empresas Estatais com status de lei complementar (para valer em todos as esferas de governo). Seriam estabelecidas regras para gerir essas empresas nos mesmos moldes do setor privado, reservando-se ao governo o poder típico do acionista controlador, via conselhos de administração. Haveria prestação periódica de contas ao Legislativo. A escolha de seus dirigentes seria feita com a contribuição de consultorias especializadas (headhunters). Os funcionários das estatais participariam do processo de escolha.
Estaria criada uma vacina poderosa contra surtos de corrupção como o que contaminou a Petrobras.