Política
17 de jan de 2011 , 14h06O que a Coreia e a China têm (e nós não)
Há quem sustente que o êxito econômico da China se deve à moeda desvalorizada, enquanto o da Coréia do Sul adviria de políticas industriais. Trata-se de simplismo que desconsidera a complexidade do processo de desenvolvimento e ignora razões mais relevantes para explicar o sucesso desses dois países.
Não é fácil falar sobre o desenvolvimento. Passados dois séculos desde a Revolução Industrial, mais de duzentas teorias buscam provar suas origens e saber por que ela aconteceu no Reino Unido e não na França ou no Japão, que dispunham de ambiente semelhante.
As políticas industriais chinesas e coreanas tiveram seu peso, mas o importante foi a estratégia por trás delas. A ideia era expor a indústria à competição internacional. O Brasil e a América Latina optaram pelo inverso, isto é, medidas contra a concorrência externa.
Enquanto a nossa estratégia buscava a substituição de importações, a deles focalizava as exportações. Para competir, era preciso adotar tecnologias e gestão típicas dos países ricos, principal destino de seus produtos. Ganhos de eficiência e produtividade vinham da inovação.
A substituição de importações gerou industrialização ineficiente e uma cultura favorável ao protecionismo. A modernização de muitos segmentos da indústria brasileira somente se acelerou quando se tornou necessário enfrentar a abertura da economia.
Aqui se negligenciou a educação, pois ela seria efeito e não causa do desenvolvimento. A China e a Coréia fizeram o contrário. Nos testes do Pisa de 2010, Xangai obteve o primeiro lugar nas três disciplinas avaliadas (leitura, matemática e ciência). Nos 65 países avaliados, a Coreia ficou perto. O Brasil se classificou entre os últimos.
Na China, a universidade pública não é gratuita, a não ser para quem prova não ser capaz de pagar mensalidades. Aqui, a gratuidade na universidade pública é geral, inclusive para os filhos dos ricos, os quais frequentam as melhores escolas e assim têm maior acesso aos cursos mais valorizados.
Na China, a Universidade de Nottingham, do Reino Unido, foi autorizada a funcionar em Ningbo. Seus cursos são ministrados em inglês e o diploma é expedido por Nottingham. Algo semelhante seria difícil de acontecer no Brasil.
Na verdade, a China despertou de séculos de declínio. Na Idade Média, era metade da economia mundial, posição alcançada pelos Estados Unidos momentaneamente em 1945. Em 1820, seu PIB ainda era três vezes a soma dos da Grã-Bretanha, França e Holanda, então as três mais ricas nações da Europa.
Os resultados da política industrial voltada para as exportações e não para substituir importações foram espetaculares. Em 1978, quando começou a abertura de Deng Xiaoping rumo à economia de mercado, a China exportava US$ 10 bilhões. Em 2010, as vendas externas atingiram US$ 1,5 trilhão.
Em 1960, a Coréia era um país pobre, com renda per capita menor do que a de Gana e do Brasil. Em 1980, medida pela paridade do poder compra, a renda per capita brasileira (US$ 3,4 mil), ainda era maior do que a coreana (US$ 2,6 mil). Dados de 2009: Coréia US$ 27,2 mil, Brasil US$ 10,4 mil e Gana US$ 1,5mil.
Apesar da ampla literatura sobre fracassos da substituição de importações, o modelo continua favorito de segmentos que se opõem à abertura da economia. Empresários brasileiros defendem abertamente o fechamento. A Força Sindical pediu ao governo federal medidas protecionistas para reverter o ritmo das importações.
Não surpreende. Afinal, o modelo beneficiou empresários escolhidos pela burocracia e trabalhadores das indústrias protegidas. O custo foi transferido à agricultura, a outros setores e ao restante da força de trabalho.
Aqui perto é igual. A ministra da Indústria da Argentina, Débora Giorgi, comemorou as barreiras à entrada de produtos estrangeiros e o renascimento da estratégia de substituição de importações.
A China e a Coréia enriquecem na esteira de condições e políticas nas quais não costumamos acreditar. São os casos do empreendedorismo dos chineses e dos estímulos à inovação, que sobreviveram ao desastre comunista. Afinal, por volta do ano 200 eles já produziam ferro fundido, mil anos antes dos europeus.