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Economia

23 de nov de 2011 , 16h15

O desafio europeu

O desafio europeu

A integração europeia – da qual a moeda única, o euro, constitui uma de suas etapas – é o mais ousado projeto político da história. A ideia começou a circular após a Primeira Guerra. John Maynard Keynes a adotou em famosa obra. Ela ganhou impulso ao término da Segunda Guerra, como meio de evitar a repetição dos horrores desses dois conflitos, em que morreram mais de 100 milhões de pessoas. Ambições territoriais haviam causado guerras. Essa motivação desapareceria com o projeto comum.

O Congresso de Haia (1948), do qual participaram Winston Churchill (1874-1965) e outros líderes europeus, lançou as bases do projeto. Em benefício da integração, os países renunciariam a uma parcela de sua soberania. O auge seria a integração política, isto é, os Estados Unidos da Europa. Era o sonho de Churchill e de outro grande pai fundador do bloco, o francês Jean Monnet (1888-1979).tica, (2) negociar em pé de igualdade questões de segurança e comércio com o outro gigante, os Estados Unidos, e (3) recuperar-se rapidamente dos estragos da guerra e promover o estado de bem-estar social. Os três objetivos foram atingidos. A paz se consolidou. Não há guerra entre os membros do bloco há 66 anos, o maior período em muitos séculos.

O projeto começou a andar com o Tratado de Paris (1951), que criou a Comunidade do Carvão e do Aço. Prosseguiu com o Tratado de Roma (1957), que lançou o Mercado Comum Europeu. Consolidou-se com o Tratado de Maastricht (1992), que estabeleceu a União Europeia e as bases da moeda única.

Infelizmente, o euro nasceu antes da hora. Ainda não existiam as condições objetivas para sua criação. O bloco não era uma área monetária ótima. Havia assimetrias inequívocas de produtividade entre os países, que requereriam uma união fiscal, em que um governo central efetuaria transferências para reduzir essas desigualdades, como ocorre em federações como a brasileira e a americana.

A crise iniciada com a insolvência da Grécia – que se espalhou para Portugal e Irlanda – realçou as fragilidades da moeda única. O risco de espraiar-se para a Espanha e Itália produziu temores de desintegração da zona do euro. A saída que alguns advogam seria o abandono da moeda pela Grécia e por outros países, que assim poderiam restabelecer suas antigas moedas e desvalorizá-las, recuperando a competividade e as condições para voltar a crescer. Ocorre que isso poderia disparar crises bancárias que contagiariam outros países, sob o risco de graves e imprevisíveis consequências econômicas, sociais e políticas. No dizer da revista The Economist, voltar às antigas moedas seria o mesmo que tentar por a pasta dental de volta ao tubo.

A dívida pública desses cinco países é de 3,3 trilhões de euros, mais do que o PIB da Alemanha. Com a Espanha e Itália ameaçadas de uma crise de confiança, somente o Banco Central Europeu (BCE) teria capacidade de acalmar os mercados, garantindo a compra ilimitada de títulos públicos da zona do euro. Os alemães resistem a isso com bons argumentos. Transformar o BCE em emprestador de última instancia para governos, dizem, violaria os tratados. Minaria a independência do banco e sua capacidade de preservar a estabilidade da moeda. Desapareceria a pressão para realizar as reformas de que aqueles países precisam para por em ordem as finanças e restaurar a competividade. As emissões de moeda provocariam inflação, que os alemães abominam. O presidente do BCE, Mario Draghi, tem repetido esses argumentos.

Mais do que princípios e riscos de inflação (baixos diante da recessão que se avizinha), o que está em jogo é a moeda única e a integração. “Se o euro fracassar, a Europa fracassará”, disse com razão a chanceler alemã Angela Merkel. Manter o euro é, pois, a ação de menor custo. Moedas antigas podem reviver, mas sob o risco de crise financeira e quebra de grandes bancos.

O desafio europeu está posto. Vencê-lo implicará baixo ou nenhum crescimento por alguns anos. O fracasso seria catastrófico para a Europa e para o mundo. Se a crise se agravar, os alemães e/ou o BCE terão que aceitar o uso do banco para salvar o euro.

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