Política
1 de jun de 2008 , 16h01Instituições e desenvolvimento
Ao conceder o grau de investimento ao Brasil, a Standard & Poor’s e a Fitch assinalaram o papel dos avanços institucionais para a nova classificação, realçando a autonomia operacional do Banco Central. Essa realidade, ainda pouco valorizada por aqui, é parte essencial do atual processo de desenvolvimento.
No Brasil, as instituições são vistas como pertencentes ao território da política, mas elas incluem as regras que promovem o capitalismo, a atividade econômica e o bem-estar.
O sistema capitalista derivou das mudanças institucionais que puseram fim ao absolutismo na Inglaterra no século 17. Distintos tipos de pré-capitalismo existiram na Antiguidade e formas avançadas ocorreram nas cidades-estado italianas, mas agora se tratava de uma revolução.
O poder supremo foi transferido para o parlamento. O fim do arbítrio monárquico desaguou na independência do Judiciário. Novas leis definiram direitos de propriedade. A segurança jurídica (contratos e direitos de propriedade seriam respeitados) criou incentivos para empreender e assumir riscos.
Adam Smith foi o primeiro a entender o novo ambiente e a teorizar sobre suas conseqüências. Observou que o produtor não mirava diretamente o interesse público, mas, guiado por uma “mão invisível”, promovia um fim que não integrava seus planos. “Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que nós devemos esperar nossa refeição, mas da busca de seu próprio interesse”.
Cerca de dois séculos depois, Ronald Coase, Douglass North e outros economistas descobriram as razões que levam o empresário a investir e a promover o interesse público descrito por Adam Smith. Por trás desse processo estão as instituições.
Instituições são as regras do jogo, que moldam a interação humana e alinham incentivos para ações de natureza política, social ou econômica. As instituições, segundo North, são formais ou informais. As primeiras são as regras criadas pelos governos. As últimas são as convenções e os códigos estabelecidos pelos indivíduos.
As organizações podem ser consideradas como parte do arcabouço institucional, pois contribuem para a interação humana. Na verdade, as organizações – o Congresso, os partidos, os ministérios, as agências reguladoras, as empresas, os sindicatos, as igrejas, etc. – surgem à medida que as instituições são construídas.
As instituições são constituídas também das crenças da sociedade e da mídia. As crenças determinam as nossas escolhas e assim contribuem para promover mudanças institucionais. A mídia – livre e independente – fornece informações à sociedade e vocaliza opiniões, constituindo instrumento para melhorar a educação e permitir o exercício de pressões em favor de avanços nas instituições.
A intolerância da sociedade brasileira à inflação e a competência da mídia são duas positivas consequências da evolução desses dois aspectos das instituições. Altas de inflação erodem a popularidade e assim criam incentivos para conduzir políticas econômicas responsáveis. Informações abalizadas ajudam os mercados a avaliar o ambiente econômico e político. Podem detectar e precificar riscos de políticas públicas insensatas.
A estabilidade macroeconômica dos últimos 14 anos é o efeito mais visível desse novo quadro, particularmente durante a era Lula. Sua extraordinária intuição – associada à percepção de que a inflação é ruim para os pobres e para sua popularidade – lhe permitiu entender essa realidade e resistir a pressões por guinadas que poriam a perder a conquista da estabilidade.
O presidente do Brasil ainda detém poderes arbitrários, como o de dar uma ordem ao Banco Central para reduzir de forma voluntarista a taxa de juros e decretar a moratória da dívida interna e externa. Fora do poder, Lula demandou ações dessa natureza. No poder, mudou de opinião, manteve a política econômica de seu antecessor e descartou propostas inconsequentes (tomara que aja assim com o “fundo soberano”).
A Lei de Responsabilidade Fiscal, a autonomia do Banco Central, as novas crenças e a qualidade da mídia asseguram a estabilidade, tornam o País previsível e nos livram da volatilidade do passado. Muito resta a fazer, mas esses e outros avanços constituem uma das mais auspiciosas transformações de nossa história.