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Política

6 de mar de 2013 , 16h44

Ideias não geniais

Ideias não geniais

A América Latina é um celeiro de ideias aparentemente geniais que não resistem ao debate sério e persistente. Muitas delas refletem equivocadas visões da esquerda ou pregam soluções simplistas para questões complexas. Como dizia o jornalista americano Henry Mencken (1880-1956), “para cada problema complexo existe uma resposta clara, simples e errada”.

Uma dessas ideias surgiu em 1971 com o livro As Veias Abertas da América Latina, do jornalista uruguaio Eduardo Galeano. Ele descreveu corretamente a tragédia da exploração predatória de riquezas regionais por colonizadores europeus, sobretudo os espanhóis, mas equivocou-se quando acusou os Estados Unidos de exercer exploração semelhante via empresas multinacionais. Em sucessivas edições, a obra tem seduzido muita gente. Galeano inspirou Plinio Apuleyo Mendoza (colombiano), Carlos Alberto Montaner (cubano) e Álvaro Vargas Llosa (peruano) a escrever o livro Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano, que contém uma crítica bem-humorada sobre como pensam (e erram) autores esquerdistas locais. Imaginar, como fez Galeano, que a prosperidade americana dependeu da exploração imperialista das riquezas latino-americanas e não da qualidade de sua educação e da solidez de suas instituições é extremamente duvidoso. O livro influenciou líderes populistas latino-americanos.

No Brasil, uma dessas ideias propõe extrair do pré-sal apenas o petróleo suficiente para financiar um plano de desenvolvimento. O restante ficaria no subsolo, valorizando-se em decorrência de suposta elevação do seu preço. Acontece que explorar o petróleo tende a ser melhor do que guardá-lo, entre outras razões porque ele pode desvalorizar-se com a descoberta de novas jazidas e com avanços tecnológicos que reduzam o seu uso. Armed Yamani, ministro do Petróleo saudita, alertava para esses riscos e lembrava que “a Idade da Pedra não acabou por falta de pedra”. Deixar o petróleo debaixo da terra é nos submeter à perda de oportunidades e à sua desvalorização. Nada genial.

Recentemente, o ministro interino de Minas e Energia externou outra dessas ideias. Ao reclamar da recusa de algumas empresas em aceitar o plano de antecipar a renovação das concessões do setor elétrico, ele disparou: “Essas companhias privilegiaram seus acionistas, e não a população brasileira”. Ora, a função essencial de uma empresa é gerar valor para seus acionistas. Nada de errado. Para tanto, ela precisa dar lucro, o que lhe permite investir, inovar e criar renda e riqueza, contribuindo para o bem-estar da população. Caso contrário, quebra, destrói valor e dispensa seus trabalhadores. A população perde.

O ministro da Educação adotou uma ideia não genial para enfrentar a carência de médicos nas áreas menos desenvolvidas. Agora, a instalação de novas faculdades de medicina dependerá da “demanda social” por médicos na região. A localidade geográfica será o principal critério a considerar. O ministro diz querer formar bons profissionais, em cursos dotados de residência médica, desde que eles estudem onde o governo determinar. Acontece que o local do curso não é determinante na fixação dos médicos. A maioria migra em busca de melhores oportunidades de emprego, formação profissional e qualidade de vida. Pesquisa recente, conduzida por Mario Scheffer, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, constatou que apenas 25% dos médicos que saíram para estudar fora permaneceram na cidade onde se graduaram. Cerca de 60% dos que ficaram na localidade onde se formaram estão nas sete maiores capitais. O dr. Scheffer diz que a medida é cosmética, pois “a desigualdade na distribuição dos profissionais somente será resolvida com um conjunto de medidas”, entre as quais o combate à precarização do trabalho e a oferta de estrutura adequada. A meu ver, a ação intervencionista do governo pode produzir profissionais de baixa qualidade e não resolverá o déficit deles em certas áreas.

Ideias constituem a fonte básica da evolução institucional e da melhoria das políticas públicas. O desafio é descartar as equivocadas, o que requer submeter todas ao debate, ao escrutínio de bons especialistas e ao exame de sua viabilidade. Não parece ser o caso dessas quatro ideais não geniais.

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