COLUNAS

Política

8 de nov de 2010 , 14h42

E agora, Lula?

E agora, Lula?

Perguntado se disputaria a presidência em 2014, Lula negou. Seria uma temeridade, afirmou. Ele tem razão, mas muitos esperam o contrário, certos de que logo se empenhará no que mais sabe fazer: campanha. Imagina-se que mandará por baixo do pano no governo Dilma, que esquentaria o lugar. O melhor é que não seja assim.

É provável que ele se faça presente em momentos de crise, que inevitavelmente virão. Dilma precisará de sua experiência, de seu trânsito político e do domínio que exerce sobre o PT. Lula terá todo interesse em ajudá-la, pois o fracasso dela seria também o seu. Afinal, ela é a sua grande criação.

Lula tem muito a ensinar. Pode ajudar Dilma a espantar tentações politicamente suicidas, como a de ressuscitar equivocadas ideias do PT. Como se sabe, Lula salvou o país do desastre e fincou o alicerce de seu êxito como presidente ao manter a política econômica de FHC, rejeitando a ruptura defendida pelos petistas.

Seu grande feito foi, assim, a continuidade. Lula não mudou o país, embora disso tenha convencido uma maioria mesmerizada por seu carisma e capacidade de comunicação. Na campanha, pediu votos para “o país que dá certo” e não para o passado que “deu errado”. Será?

Se fosse verdade, ele não teria sido presidente. Com altos e baixos, o Brasil dá certo desde a Independência. Apesar de não termos herdado o melhor em cultura e instituições, preservamos algo fundamental: a integridade territorial, que devemos a José Bonifácio (o Patriarca) e aos imperadores Pedro I e Pedro II.

O domínio espanhol se fragmentou em 18 países. Caso acontecesse o mesmo nas terras de Portugal, Lula teria nascido em um país chamado Pernambuco e migrado para outro denominado São Paulo, onde um estrangeiro não poderia ser presidente.

Voltemos à realidade. Se Lula quiser atuar nos bastidores para retornar ao poder, vai dar errado. Dilma não pode esquivar-se dos compromissos que lhe impõe o cargo nem virar um fantoche. Pelo que se sabe, ela não faz o gênero.
Os holofotes da opinião pública e da imprensa são fixos. Não se movem para acompanhar o presidente que sai. A partir de 2011, seu foco será em Dilma e nos atos gerados por sua caneta. Se Lula pretender agir como um aiatolá a influenciar o governo, como disse Bolívar Lamounier, também dará errado.

Ex-chefes de governo nem sempre se destacam depois do mandato. Os que o conseguem costumam deter qualidades pessoais que os distinguem. Casos recentes são os presidentes americanos Carter e Clinton. No Reino Unido, Tony Blair. No Brasil, Fernando Henrique. Outros ajudam se ficarem discretos ou silentes.

Lula sabe os riscos do sonho de voltar ao poder. O governo Dilma não contará com a sorte do seu. O cenário internacional não é favorável. A economia pode começar a perder ritmo por causa da piora no sistema tributário e da infraestrutura, ao lado dos efeitos retardados do aparelhamento do estado, da corrupção e da deterioração fiscal.

Dilma pode não ter uma oposição tão acanhada como a dos tempos de Lula, a qual assistiu praticamente inerte à desconstrução sistemática dos feitos do governo FHC e à elevação de Lula à condição de marco zero. Uma oposição refundada não se acovardará. Não se envergonhará da privatização nem se calará sobre seus benefícios.

Se a economia desacelerar, haverá fortes demandas por medidas calamitosas, como seria a decisão “desenvolvimentista” de baixar juros. A presença de Palocci no novo governo, tida como certa, pode neutralizá-las e manter a tranqüilidade nos mercados, mas isso exige o pragmatismo de Lula. Dilma o terá?

A nova presidente pode surpreender: monta um bom ministério, escolhe bem no Banco Central e nas estatais, reverte a deterioração fiscal, avança em reformas estruturais e amplia investimentos em infraestrutura. Mas aí o decorrente êxito a credenciaria à reeleição. Por que deixaria o lugar para Lula?

Muito se fala sobre o futuro de Lula: criará uma fundação dedicada a questões sociais, ajudará países africanos a se livrar da pobreza, cuidará da reforma política, dirigirá uma organização internacional e por aí afora. Qualquer que seja seu destino, Lula faria bem a si e ao país se buscasse ser um grande ex-presidente.

← Voltar