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Economia

7 de ago de 2008 , 14h59

A crise piora, mas o Brasil se sai bem

A crise piora, mas o Brasil se sai bem

Nas últimas semanas, aumentou a percepção de que a crise financeira americana é pior do que se imaginava. Suas ramificações na economia mundial também parecem ser maiores do que se diagnosticava. A recessão em países desenvolvidos tende a ser mais intensa e prolongada do que diziam as análises. Apareceram temores de uma recessão global. As bolsas de valores refletem o clima negativo.

Enquanto isso, jornais e revistas de prestígio nos EUA e na Europa têm publicado reportagens positivas sobre a economia brasileira, apontando sua resistência a choques externos e seu inegável potencial. Tornou-se unânime o reconhecimento da competência e da autonomia do Banco Central na política monetária.

No front pessimista, o Financial Times publicou recentemente artigos sobre a crise (www.ft.com/bigfreeze). Um dos autores, o ex-secretário do Tesouro dos EUA e ex-reitor da Universidade de Harvard, Larry Summers, traçou um panorama sombrio da situação. Ele crê que ainda são altos os riscos de crise sistêmica e prega medidas heroicas para evitar uma grave descapitalização das instituições financeiras americanas.

Summers assinala que as crises passadas resultaram de choques de oferta e estagflação (anos 1970). De estouros de bolhas, que provocaram desarticulação no sistema financeiro e declínio prolongado na atividade econômica (EUA nos anos 1930 e Japão na década de 1990). E de perda de credibilidade dos bancos centrais para combater a inflação (final dos anos 1960 e década de 1970). Desta vez, há uma simultaneidade dessas causas.

Há quatro círculos viciosos na economia americana: (1) queda no valor dos ativos, que induz sua venda e força os preços para baixo; (2) perdas dos bancos, que reduzem sua capacidade de financiar investimento, diminuem o valor dos ativos e causam novas perdas; (3) fragilidade do sistema financeiro, que reduz o crescimento e o enfraquece; e (2) queda do produto, que reduz o emprego, diminui a demanda e faz cair o produto.

Existem análises mais pessimistas, como a do economista americano Nouriel Roubini, que estima as perdas do sistema financeiro em mais de US$ 2 trilhões (para o FMI, serão US$ 945 bilhões), o que provocará mais contração de crédito e recessão. Para Summers, o Tesouro dos EUA terá que comprar ativos e ações dos bancos, para evitar o colapso de sua capacidade de emprestar e os consequentes efeitos na economia.

É possível que essas visões alarmistas não se confirmem. O crescimento dos países emergentes, particularmente da China, e a flexibilidade da economia americana podem reduzir os efeitos mais graves da atual crise sobre a economia mundial. A recessão, que já está instalada no Japão, na Itália e em outros países, seria forte, mas dificilmente alcançaria o temido grau de intensidade e duração.

Quanto ao Brasil, as visões favoráveis parecem basear-se na percepção de que a estabilidade macroeconômica é duradoura e de que estamos livres do risco de voluntarismos na condução das políticas monetária e cambial. Malgrado a falta ou a lentidão de reformas, as transformações postas em marcha pelo fim da inflação e pela abertura da economia, e o atual ciclo das commodities (que tende a se manter apesar das quedas recentes de seus preços) têm permitido explorar as grandes oportunidades da nossa economia.

Nesse contexto, realça o papel do Banco Central. Sob críticas de dentro e fora do governo, tem conduzido suas responsabilidades de forma muito eficaz. Tornou-se altamente previsível e construiu inédita credibilidade interna e externa. Ao contribuir decisivamente para a preservação da estabilidade, transformou-se em um dos poucos centros de excelência do atual governo. Ao presidente Lula cabe o mérito de blindar o banco contra as investidas de seus companheiros de partido e de governo, e a corajosa decisão de abandonar as idéias equivocadas que nutria sobre a política monetária.

O estatismo e o anticapitalismo de muitas áreas, como demonstra a idéia de mudar o marco regulatório do petróleo e criar uma nova estatal, vai nos custar caro. Felizmente, a estabilidade macroeconômica permitiu que aproveitássemos os ventos favoráveis da economia mundial. Poderia ter sido melhor, mas se considerarmos o que teria acontecido se o BC seguisse as idéias do PT, dá para comemorar.

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