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Política

24 de ago de 2008 , 14h49

Campos, Simonsen e a volta de velhos fantasmas

Campos, Simonsen e a volta de velhos fantasmas

Dois ilustres brasileiros, Roberto Campos e Mário Henrique Simonsen, dedicaram seu vigor intelectual à luta contra a irracionalidade econômica. Simonsen dizia que “a ignorância econômica das elites brasileiras é oceânica”. Campos rotulou de “besteirol” os dispositivos da Constituição de 1988 que agrediam o bom senso.

Em uma de suas penetrantes frases, Campos disse que “o petróleo é apenas um líquido pegajoso e fedorento”. Buscava contestar a obtusa tese nacionalista de que o petróleo, um bem do povo, deveria ter sua exploração monopolizada pelo Estado. Não duvidava de que o petróleo era do povo, mas dizia que transformá-lo em bem-estar dependia de sua extração eficiente, com a participação do setor privado.

Campos parecia ter vencido diante da eliminação do monopólio do petróleo e da aprovação de um novo marco regulatório em 1997, quando ainda vivia. O novo ambiente atraiu muitas empresas, que contribuíram, juntamente com a Petrobrás, para as descobertas do pré-sal. Infelizmente, o velho fantasma combatido por Campos voltou. Lula, ministros e aliados retomaram vetustos slogans populistas e agora defendem uma nova estatal, que seguiria o modelo norueguês.

A motivação e as propostas são equivocadas, como disseram vários especialistas. Além disso, na Noruega os recursos alimentam um fundo voltado para as gerações futuras. Aqui, o governo os gastaria, se possível antecipadamente mediante a venda de títulos vinculados à extração do petróleo.

Assim, em vez de reforçar a poupança nacional para viabilizar níveis mais altos de investimento e ampliar o potencial de crescimento, o dinheiro seria gasto em educação e outros programas. Ocorre que o problema da educação não é a falta de recursos, mas o seu mau uso, principalmente a concentração no ensino superior gratuito.

Na Noruega, as estatais são geridas por profissionais recrutados por mérito. Aqui, no atual governo,há forte presença de meros apadrinhados políticos na direção dessas empresas e nos órgãos de regulação. Não será diferente se vier a Petrosal. Não descartemos o uso da nova estatal nas eleições de 2010. O sentimento estatista da maioria do eleitorado seria explorado sem escrúpulos como em 2006, quando se acusou Alckmim de ter planos de privatizar o Banco do Brasil.

Voltemos a Simonsen. É dele a frase que agora ressuscitou: “a inflação aleija, mas o câmbio mata”. Alertava sobre a deterioração nas contas externas, que requeriam ajuste no câmbio. Se vivo fosse, não repetiria a frase, dita em contexto radicalmente distinto, em época de câmbio fixo, inflação alta, economia fechada, reservas internacionais modestas e Banco Central sem autonomia. Como já sustentei neste espaço (13/7/2008), dificilmente morreremos de crise externa.

Mesmo assim, é crescente o número dos que enxergam uma crise de balanço de pagamentos em gestação, igual àquelas do passado. O forte crescimento do déficit em conta-corrente seria o prenúncio do desastre. Reapareceram propostas voluntaristas para promover a desvalorização cambial, incluindo bolorentas idéias de controle de capitais.

É difícil enxergar essa crise quando se considera (1) que o regime de câmbio flutuante pode promover, se necessário, o ordenado ajuste da taxa cambial; (2) o fato de possuirmos reservas superiores ao valor da dívida externa. Se a desvalorização ocorrer, reduz-se o potencial de saídas de divisas (valerão menos em reais) e melhora a relação dívida pública/PIB, dada a nossa condição de credor externo. Uma crise externa viria mais de uma grave perda de confiança (como seria o caso se o BC perdesse sua autonomia) do que pelas razões que explicaram sua ocorrência no passado.

Campos e Simonsen contribuíram muito para as transformações mentais que se têm observado nos últimos anos, entre as quais a valorização da estabilidade, a consciência sobre os exageros da carga tributária e a maior aceitação da economia de mercado. Opiniões mais esclarecidas foram formadas graças à atuação desses dois líderes, na cátedra, nos livros, nos artigos e nos eventos voltados para o debate de idéias.

O ressurgimento de velhos fantasmas mostra, todavia, quão distantes ainda estamos da compreensão mais ampla dos fenômenos econômicos e de nos livrarmos dos cacoetes estatizantes.

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