Economia
20 de maio de 2009 , 13h04Antiglobalização financeira
A crise financeira tem gerado extensa produção intelectual. Há estudos sobre as origens e conseqüências da crise, sobre medidas regulatórias para evitar sua repetição e por aí afora. Autores de peso como Dani Rodrik, da Universidade Harvard, criticam a globalização financeira.
Rodrik é peremptório. O processo é uma decepção e por isso existem apenas duas escolhas: impedir ou estimular a globalização financeira. Governos que optam pelo estímulo estão redondamente enganados. Há adeptos da tese no Brasil. Ver o texto em http://www.palgrave-journals.com/imfsp/journal/v56/n1/full/imfsp200829a.html.
M. Ayhan Kose, do FMI, não é tão incisivo. Ao examinar a literatura sobre o tema, reconheceu a dificuldade de extrair conclusão firme sobre os benefícios da globalização financeira, salvo para os países industrializados. Para os países emergentes, tudo dependeria de certas condições prévias, tais como desenvolvimento do sistema financeiro, qualidade das instituições, abertura comercial e estabilidade macroeconômica. O estudo está em http://www.nber.org/papers/w1496.
A globalização financeira nasceu no mesmo tempo da Revolução Industrial. O investimento estrangeiro direto – uma de suas características – já era extenso no século XIX. No princípio do século XX, países não industrializados – incluído o Brasil – tinham acesso aos mercados internacionais de capitais.
Muito mais antiga é a globalização econômica, que na definição de Jagdish Bhagwati significa a integração das economias nacionais na economia internacional através do comércio exterior, do investimento estrangeiro direto e do fluxo de capitais, de trabalhadores e de tecnologia.
O Império Romano foi uma das primeiras manifestações da globalização. O mesmo se dirá das rotas da seda, iniciadas muito antes da era cristã. Por mais de dois mil anos, nelas transitaram mercadorias, peregrinos, missionários e militares na China, na Índia, na Pérsia e nos países do Mediterrâneo. No século XVI, Portugal criou a primeira globalização baseada no comércio na África, na América do Sul e na Ásia.
A globalização financeira se alargou a partir dos anos 1980 na esteira da desregulação e da redução de custos proporcionada pela tecnologia de comunicações e de informação. O Brasil se beneficiou do processo, particularmente depois dos avanços institucionais que asseguraram a estabilidade macroeconômica e a solidez do sistema financeiro.
O acesso aos mercados internacionais de capitais foi fundamental para que empresas como a Vale, a Embraer, a Odebrecht, a Gerdau, a Anbev e outras alcançassem pujança econômica e projeção internacional. Companhias brasileiras abriram seu capital em lançamentos globais. Títulos do Tesouro em reais foram colocados no exterior, o que nos redimiu do “pecado capital”, qual seja a incapacidade de um país financiar-se no exterior em sua própria moeda.
A globalização financeira, associada a melhores instituições e à estabilidade macroeconômica, contribuiu para elevar a taxa de investimento do Brasil, de 15,3% para 19% do PIB entre 2003 e 2008, tendência que se manteve após o ressurgimento de déficit em conta-corrente do balanço de pagamentos. Ao contrário do que dizem os críticos, os fluxos externos financiaram o investimento e não o consumo.
Rejeitar a globalização financeira seria isolar o país. Voltaríamos ao controle de capitais. Poderiam retornar os limites nas compras de moeda estrangeira para viagens, tratamento de saúde e estudo no exterior. Haveria restrições para o uso do cartão de crédito no exterior e para compras na internet, como a de livros na Amazon.
E para as empresas? Operações em mercados futuros, essenciais para o agronegócio, a mineração e outros segmentos ficariam inviáveis, pois as remessas para cobertura de margens – que devem ser instantâneas – ficariam à mercê da burocracia. O sistema financeiro e o mercado de capitais voltariam à idade da pedra.
Seria um horror, mas o mercado encontraria brechas, a um custo elevadíssimo e com muita corrupção.
O Brasil já atingiu estágio que lhe permite ganhar com a integração aos fluxos mundiais de comércio e finanças. Às favas, pois, as teses antiglobalização financeira.