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Política

8 de jan de 2014 , 20h50

Airbags, freios ABS e destruição criativa

Airbags, freios ABS e destruição criativa

O ministro da Fazenda anunciou, em dezembro passado, a intenção de suspender a aplicação de norma que tornava obrigatória, a partir de 2014, a fabricação de automóveis novos com airbags e freios ABS. As razões seriam o impacto inflacionário do aumento de preços (da ordem de menos de 0,1% no IPCA) e a supressão de postos de trabalho por causa da descontinuidade de modelos, particularmente da Kombi.

O ministro cometeu três equívocos: (1) interferiu em área que não lhe diz respeito. A norma foi instituída há quase cinco anos por resoluções de 3 de abril de 2009 do Contran, órgão do Ministério das Cidades; (2) submeteu a segurança dos usuários de automóveis ao objetivo de controle dos índices de preços, que reprime a inflação, é verdade, mas não ataca suas causas; (3) cedeu à pressão de sindicatos de trabalhadores da indústria automobilística para adiar um avanço tecnológico, barrando a “destruição criativa”, que é a essência do crescimento. De tão absurda, a medida foi descartada.

“Destruição criativa” é um conceito difundido pelo economista Joseph Schumpeter (1883-1950). Sua origem é o Manifesto Comunista de 1818, de Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). O manifesto referiu-se às crises de superprodução que supostamente ameaçavam a burguesia. “Periodicamente, tais crises destroem não apenas grande parte da produção, mas também forças produtivas preexistentes”. Essa destruição e a conquista de novos mercados seriam a forma de a burguesia vencer as crises.

Schumpeter interpretou a “destruição criativa” de forma positiva, isto é, como um processo de inovação que impulsiona o crescimento econômico. Para ele, “o impulso fundamental que aciona o motor capitalista e o mantém em movimento vem dos novos produtos de consumo, dos novos métodos de produção e transporte, dos novos mercados e das novas formas de organização criadas pelas empresas capitalistas”. Isso “revoluciona incessantemente a estrutura da economia, incessantemente destruindo a velha ordem, incessantemente criando uma nova ordem”.

A “destruição criativa”, como lembra Daron Acemoglu (Why Nations Fail, 2012), “substitui o velho pelo novo. Setores novos atraem novos recursos. Firmas novas substituem as velhas. Habilidades e equipamentos se tornam obsoletos com as novas tecnologias.” Surgem ganhadores e perdedores, e estes se opõem às mudanças. De fato, os luditas ingleses destruíam máquinas no século XIX na vã ilusão de restaurar empregos. Não percebiam que o progresso proporcionado pelo avanço tecnológico criava empregos em outros lugares. O desafio era adaptar-se à nova realidade. A lâmpada elétrica de Thomas Edison (1847-1931) tornou obsoletos a iluminação a querosene dominada por John D. Rockefeller (1839-1937) e o emprego dos acendedores de lanternas. A reação correta de Rockefeller foi migrar para um novo mercado, o da gasolina. Os acendedores encontraram outras ocupações.

Na era da tecnologia digital, o processo se acelerou. O disco de vinil reinou por algumas décadas até ser aposentado pelo CD, que ficou ultrapassado em menos de 20 anos.A compra de música pela internet fecha lojas de discos. Exemplo notável de como navegar nas ondas da inovação é o da revista The Economist. O aumento da circulação em tablets e smartphones mais do que compensa a perda de assinantes da versão impressa.

A “destruição criativa” eleva a produtividade e faz a economia crescer. Mais trabalhadores ingressam no mercado de consumo. O bem-estar se expande para novos estratos da sociedade.

Airbags e freios ABS são partes desse processo. A Kombi, obsoleta, deixou de ser produzida há trinta anos na Alemanha e há vinte anos no México. Aqui, sumirá por não poder receber esses equipamentos de segurança.

Felizmente, a ideia impensada do ministro não teve futuro. O argumento de preservar empregos era utilizado pelos que perdiam com a marcha implacável da “destruição criativa”. Como no passado, os trabalhadores dificilmente ficarão ociosos. A alegação de evitar o efeito nos índices de preços não faz o menor sentido. Como me disse um amigo, o controle artificial do custo de vida não poderia suplantar o objetivo de preservar a vida.

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