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7 de jan de 2021 , 07h41

Voto impresso: ineficiente, mas bom para ser comprado

O impresso comprovaria que o eleitor votou em seu distrito, assegurando ao comprador do voto o exercício do compromisso assumido com a venda do sufrágio

Muitos têm buscado interpretar a insistência com que o presidente Jair Bolsonaro defende a instituição do voto impresso. Difícil explicar depois de quase um quarto de século do voto eletrônico no Brasil, até agora sem nenhum indício de fraude. Ao contrário, especialistas no Brasil e no exterior atestam a segurança do sistema, cuja confiabilidade tem permitido que outros países o adotem no exercício de um dos mais relevantes direitos fundamentais da democracia. O Brasil exporta tecnologia nesse campo.

Uma interpretação poderia ser o desejo de Bolsonaro de criar uma resistência a eventual derrota eleitoral em 2022, quando alegaria fraudes para recusar-se a reconhecer os seus resultados. Seria a repetição da estratégia do seu ídolo, o presidente americano, Donald Trump. Sem provas, Trump insistiu na tese insustentável de que teria sido eleito em novembro último, mas fraudadores a serviço do Partido Democrata o teriam privado de uma vitória certa. Como se sabe, incitou seus apoiadores a invadir o Congresso, o que resultou em ataque inédito à democracia americana, perplexidade nos EUA e em outros países ricos e morte de quatro dos invasores. Apesar desse fracasso, Bolsonaro mantém sua insana acusação ao suposto potencial de fraude do voto eletrônico no país.

Tudo indica que Bolsonaro enfrentará resistências para seu projeto, em oposição à maioria dos brasileiros que apoiam o sistema. Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em dezembro último mostrou que 73% dos brasileiros confiam no voto eletrônico. Mesmo que o Congresso viesse a aprovar a proposta, ela poderia não ser aceita pelo Judiciário, que já se manifestou contra a ideia de imprimir o voto.

O voto impresso criaria custos e ineficiências nas eleições, mas teria uma função, a de incentivar a compra de votos. É conhecido o “voto de cabresto”, uma prática muito comum nas regiões menos desenvolvidas do país em tempos passados. Sabe-se a história. Quando o voto era exercido mediante uma papeleta contendo o nome impresso de candidatos, os coronéis do interior entregavam essa papeleta ao eleitor, que se comprometia a depositá-la na urna. Depois de votar, ele voltava à residência do coronel, mostrava o título assinado pelos mesários das zonas eleitorais. Era a prova que o habilitava a receber o pagamento, em dinheiro, do compromisso cumprido.

Havia, lógico, um potencial de fraude contra o coronel, pois o eleitor poderia, no percurso para a sala de votação, receber papeletas de outros candidatos. O coronel gastava dinheiro em vão. Com o voto impresso defendido por Bolsonaro, essa pequena fraude se tornaria mais difícil, pois o documento expelido pela impressora conteria os dados do local de votação. Restaria a hipótese de o eleitor teclar o nome de outros candidatos que não o preferido do coronel. Seria, contudo, mais difícil enganar o comprador. O Brasil retrocederia décadas.

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