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12 de fev de 2022 , 08h03

O desastre da PEC Kamikaze é garantido

O custo fiscal da medida, com vistas a reduzir os preços dos combustíveis, e o sinal equivocado que emite pode gerar mais inflação

Foi muito apropriada a denominação que os técnicos do Ministério da Economia deram à Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que busca reduzir o preço dos combustíveis mediante isenção de tributos federais que nele incidem, isto é, PIS, Cofins e CIDE. Os estados seriam “autorizados” a reduzir o ICMS. A medida, que tem merecido entusiasmado apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira, seria um completo desastre, caso aprovada.

A ideia de reduzir o preço dos combustíveis constitui um rosário de erros. Para começar, promoveria a anulação do papel que os preços exercem em uma economia de mercado, qual seja o de influenciar decisões de consumo. Se um preço sobe muito, os consumidores procuram um substituto mais barato ou simplesmente deixam de adquirir o bem ou o serviço. O preço se ajusta e cai.

Além disso, intenta-se diminuir o preço de um produto altamente poluente, o que beneficiará proprietários de veículos e de embarcações, inclusive as de lazer. Terá efeito social regressivo. Adicionalmente, a renúncia fiscal significará uma perda de até 100 bilhões de reais da arrecadação tributária da União, em momento de grave crise fiscal.

Há uma pressão para que os Estados sejam “autorizados” a seguir a União. Trata-se de desconhecimento da legislação que rege o ICMS. A Constituição confere aos governos estaduais, via assembleias legislativas, o poder de alterar as alíquotas e o regime de tributação do ICMS.

O objetivo da PEC é contribuir para melhorar a popularidade do presidente Jair Bolsonaro, que busca a reeleição. Outro seria driblar a Lei de Responsabilidade Fiscal, que exige compensações em casos de renúncia fiscal. Ou se aumenta outro tributo ou se corta gasto. Tudo muito irresponsável.

O tiro pode sair pela culatra, como bem salientou o Banco Central (BC) na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária, divulgada esta semana. “Mesmo políticas fiscais que tenham efeitos baixistas sobre a inflação no curto prazo podem causar deterioração nos prêmios de risco, aumento das expectativas de inflação e, consequentemente, um efeito altista na inflação prospectiva”.

Na peculiaridade de seu linguajar, o alerta do BC indica que o populismo da PEC tende a reduzir a credibilidade da gestão da política fiscal, o que pode reduzir a confiança na economia brasileira. Isso acarretaria fuga de capitais e aumento da percepção de risco, provocando desvalorização da nossa moeda. O dólar mais caro impactaria na inflação.

A resumo, a mensagem do BC é clara. A PEC Kamikaze pode ter efeito exatamente contrário ao objetivo de reduzir os preços dos combustíveis. Haverá mais e não menos inflação. Admira que os políticos que apoiam a medida sejam incapazes de absorver essa lição de nossa autoridade monetária. Triste.

Por Maílson da Nóbrega 12 fev 2022, 12h17

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