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7 de nov de 2011 , 22h05

A não ser por um acidente, a Grécia deve permanecer no euro

Muitos analistas têm sugerido que o abandono do euro pela Grécia seria a saída para seus graves problemas. Permitiria a recuperação econômica, pois ao retornar à dracma os gregos poderiam desvalorizar sua moeda, o que expandiria as exportações e desestimularia importações. O efeito líquido seria uma elevação da demanda por bens e serviços gregos, o que geraria mais renda, produto e emprego. Dá-se como exemplo o caso da Argentina, que se recuperou depois que abandonou a conversibilidade em 2001, a que se seguiu um monumental calote na dívida. Será?

O caso grego não é tão simples assim. Para sair do euro, seria preciso mudar tratados, o que exige o voto dos outros 26 membros da União Europeia. Não há provisão institucional para o abandono da moeda. Portugal votaria contra, pois ficaria claro que seria o primeiro da fila no correspondente contágio, o que o levaria à insolvência. A Alemanha votaria contra, pois ela é a maior beneficiária do euro. Ganhou mais competitividade com a desvalorização da moeda e se livrou de desvalorizações competitivas de seus vizinhos. Cerca de 75% do superávit comercial alemão vêm da Zona do Euro.

A Grécia poderia sair unilateralmente, pois ainda retém soberania para tanto. Perderia, todavia, o acesso aos recursos da União Europeia, o uso de uma moeda igual à dos alemães e a liberdade de trabalho de seus cidadãos em qualquer país da região. Pesquisas mostram que a grande maioria dos gregos considera sua entrada no euro uma conquista e preza muito os respectivos status e benefícios. A saída unilateral teria efeitos desastrosos. A desvalorização da dracma, que também ocorreria na saída negociada, geraria enormes prejuízos para as empresas endividadas em euro. Os bancos poderiam quebrar. Além da inadimplência dos devedores, haveria um efeito pior: os depositantes, antecipando o caos, correriam para retirar suas poupanças para transformá-las em euros.

A saída desordenada da zona do euro poderia acarretar a quebra de grandes bancos europeus expostos à dívida grega, tanto do governo, quanto de bancos e empresas. Se a crise se alastrasse para outros países, como é provável, poderia ser uma catástrofe. A dívida dos cinco países ameaçados (além da Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha e Itália) alcança 3,3 trilhões de euros, mais do que o PIB da Alemanha. A moeda única poderia entrar em colapso, a menos que o Banco Central Europeu garantisse toda essa dívida. Os alemães são contrários a essa ação. Qualquer líder europeu sabe desses riscos. Por isso, tudo se fará para evitar a catástrofe.

O euro é mais do que uma moeda única. Sua instituição foi um passo no caminho da integração europeia, cujas origens remontam aos dias imediatamente posteriores ao fim da Segunda Guerra. Nessa época, entendeu-se que a integração seria o meio para evitar a repetição dos horrores do conflito. E funcionou. Os europeus não guerreiam entre si há 66 anos, o maior período em muitos séculos. Ninguém poria em risco a conquista dessa paz.

Há muitas disfuncionalidades no euro, incluindo a ausência de uma união fiscal de transferências e de uma supervisão supranacional do sistema financeiro regional. A Grécia vai levar muitos anos, talvez uma década, para aumentar sua competitividade e voltar a crescer. Os custos sociais dessa década perdida são muito altos e podem causar problemas sociais e políticos complexos. Mesmo assim, o que está em jogo em última análise é a viabilidade do euro e a preservação do ambiente de paz.

A Grécia precisa permanecer no euro. Isso é essencial para dispor do apoio e dos incentivos à realização de duras reformas estruturais, incluindo o enfrentamento de injustificáveis privilégios. Não será fácil, mas isso poderá render-lhe ganhos de eficiência e produtividade que a manterão conectada no trem europeu. A saída do euro poderia desgarrar o país desse conjunto e tornar mais difícil a realização das reformas. A Grécia poderia ficar definitivamente para trás.

Há escolhas difíceis a fazer, existe risco de um acontecimento inesperado que torne a saída do euro inevitável e até mesmo contribua para o fim do sonho da moeda única. Mas é difícil acreditar que o desligamento da Grécia se daria de forma voluntária.

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