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2 de mar de 2011 , 23h36

Mudou a política econômica?

No anúncio dos corte de despesas de R$ 50 bilhões nesta segunda-feira, o ministro da Fazenda repetiu mais de uma vez que a política econômica não havia mudado. No dia anterior, em entrevista à Folha de S. Paulo, S.Exa. enfatizou a continuidade que a seu ver caracterizava o atual governo, que denominou incompreensivelmente de “Lula3”, seja lá o que isso signifique. Qual seria o sentido da ênfase à permanência da política econômica?

Não há como discordar do ministro. A política econômica tem sido a mesma desde 1999, quando se introduziu os regimes de câmbio flutuante e de metas para a inflação. A partir de então, firmou-se o chamado tripé da política econômica, caracterizado por câmbio flutuante, política fiscal centrada na geração de superávits primários e metas de inflação fixadas pelo governo e perseguidas de forma autônoma pelo Banco Central. Nesses doze anos, o êxito dessa combinação de políticas públicas é inquestionável. A estabilidade macroeconômica assegurada pelo tripé constituiu o principal fator explicativo da resistência do país aos efeitos da severa crise financeira mundial de 2008.

Quando Guido Mantega foi confirmado no cargo pela presidente Dilma, surgiram especulações de que ele teria condicionado a aceitação do convite à determinação para que o Banco Central se alinhasse às teses da Fazenda e às suas críticas, veladas ou explícitas, à política monetária. Por isso, ele teria exigido a substituição de Henrique Meirelles na presidência do BC. Verdadeiras ou não tais especulações (há quem afirme ter ouvido Mantega confirmando a versão), é certo que segmentos da imprensa compraram a tese. Muitas reportagens passaram a tratar do suposto “alinhamento” do BC à Fazenda.

Analistas críticos da atuação do Banco Central festejaram a “mudança”. Um deles publicou mais de um artigo em cujos títulos incorporava a ideia de que estaria em curso uma nova política econômica, agora na linha da Fazenda. Houve quem, sem razão, enxergasse nas medidas macroprudenciais adotadas no final de 2010, isto é, o aumento dos depósitos compulsórios dos bancos no BC e de mais capital para certas operações de crédito ao consumidor, como uma prova da “mudança”. Em vez de juros, restrições ao crédito. A tese foi desmentida com o início de um novo ciclo de alevação dos juros a partir de janeiro deste ano, mas seus adeptos continuaram a divulgá-la.

Na verdade, a prática veio mostrar que foi a Fazenda que se alinhou e não o contrário. O BC conseguiu, via documentos que publica periodicamente ou por interlucução no governo, mostrar a necessidade do corte de despesas. Antes, a Fazenda justificava a excessiva expansão dos gastos, menosprezava os críticos e sustentava que o forte aumento das despesas não era causa de inflação. Mesmo que se duvide do cumprimento da meta de corte (que muito dependerá da execução orçamentária e da firmeza das autoridades da Fazenda), é fato que o anúncio do programa pelos ministros da Fazenda e do Planejamento representa uma inflexão nos rumos da política fiscal praticada em 2009 e 2010.

Embora a política econômica não tenha mudado desde 1999, sua qualidade piorou muito nos dois últimos anos. Isso incluiu grave perda da credibilidade da política fiscal, por conta do uso de subterfúgios e de contabilidade criativa para esconder o descumprimenmto da meta de superávit primário.

Repetindo, o ministro da Fazenda tem razão quando diz que a política econômica não mudou, mas ao curvar-se à necessidade dos cortes (e promovê-los efetivamente) S.Exa. pode estar contribuindo para restaurar a credibilidade da política fiscal e para melhorar a qualidade da política econômica.

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