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27 de out de 2020 , 20h30

Intervenção à vista no mercado de soja?

A preocupação do presidente com o aumento do preço da soja no mercado interno não pode levar ao erro de impor controle sobre as respectivas exportações

Ao falar hoje sobre o mercado de soja, o presidente Jair Bolsonaro disse que a produção brasileira “tem de ficar um pouquinho no Brasil. Se não ficar, bagunça o preço do nosso óleo de soja aqui”. Com efeito, os preços atrativos da soja no mercado internacional têm acarretado expressiva elevação das vendas externas da soja e de seus derivados, em resposta à forte demanda oriunda da China. Como seria de esperar, já há pressões nos preços internos do produto.

Bolsonaro parece preocupado com o eventual impacto dos preços internos da soja em sua popularidade. Hoje à tarde ele se reúne com representantes do setor, ao lado da ministra da Agricultura, Teresa Cristina. O que esperar dessa reunião?

Só existe uma maneira de “ficar um pouquinho de soja no Brasil”, como quer o presidente: uma intervenção do governo no mercado do produto. Era assim que funcionava no governo militar, quando as exportações de commodities eram penalizadas mediante imposição de tributos sobre as vendas externas ou controle quantitativo. Em casos extremos, chegou-se a proibir tais exportações.

O que se vê hoje no Brasil ocorre também em outros países exportadores de soja, como Estados Unidos e Argentina. No caso brasileiro, existe um impulso adicional para as vendas externas de soja, qual seja a depreciação cambial, que tem sido maior do que a observada nos demais países emergentes. A explicação está na percepção de risco decorrente da grave situação fiscal do país.

Os mercados se ajustarão naturalmente à situação momentânea do comércio mundial de commodities. É assim há séculos e já há algum tempo no Brasil. Surgirão os incentivos habituais de mercado, que direcionarão parte da produção de soja para o mercado interno, como aliás tem sido precisamente o caso neste momento. Além disso, é livre a importação de soja, o que poderá contribuir para esse ajuste do mercado.

Bem faria Bolsonaro se consultasse os ministros da Economia e da Agricultura antes de expor suas visões defasadas do mundo sobre o funcionamento do mercado, principalmente nos casos que envolvam o comércio exterior.

 

Por Maílson da Nóbrega – Atualizado em 27 out 2020, 16h45 – Publicado em 27 out 2020, 13h50

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