ICMS nos combustíveis: bravata sem sentido
A guerra que o presidente Jair Bolsonaro trava com os governadores sobre o ICMS incidente nos combustíveis continuou ontem. Os Estados e o DF haviam reagido negativamente à ideia do presidente, de interferir no principal tributo estadual, mediante proposta ao Congresso para mudar a forma de cobrança nesses casos, que passaria a ser um valor fixo, em lugar de um percentual sobre o preço de venda.
Os governadores realçaram, corretamente, que a Constituição considera o ICMS um tributo estadual, não cabendo poder à União para mudá-lo. Poderiam ter assinalado que há uma proibição explícita no artigo 151, inciso III da Carta Magna, pelo qual à União é vedado “instituir isenções de tributos de competência dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.
Benefícios do ICMS, como seria o caso da mudança na forma de cálculo, que implicaria perdas de arrecadação, não podem ser objeto, pois, de projetos de lei apresentados ao Congresso. Mudanças no ICMS são possíveis mediante convênios firmados no âmbito do Conselho de Administração Fazendária (Confaz). Se contiverem algum benefício fiscal, exige-se unanimidade para sua aprovação.
No caso em tela, a ideia dificilmente obteria a unanimidade, dado que o ICMS sobre combustíveis representa mais de 20% da receita dos Estados. Como a maioria enfrenta séria crise fiscal, a proposta dificilmente seria acolhida. Bastaria um governador ficar contra para inviabilizar a proposta. Mais, 25% do ICMS pertencem aos municípios, o que mobilizaria os prefeitos contra a medida. A discussão deveria ter parado aí.
Sucede que os governadores, com certa ironia, sugeriram que o governo federal isentasse a cobrança de PIS e Cofins incidentes nos combustíveis. A resposta do presidente veio com uma bravata: Bolsonaro eliminaria os tributos federais se eles aceitassem a ideia de cobrar o ICMS por um valor fixo.
Do lado da União, a bravata não faz o menor sentido. A arrecadação federal sobre combustíveis foi de R$ 27 bilhões em 2019, o que representa cerca de um terço do superávit fiscal do período. Não há como abrir mão dessa receita.
Nada dessa confusão teria acontecido se Bolsonaro ouvisse as áreas técnicas antes de mover-se por impulso e anunciar medidas sem respaldo na Constituição e na realidade.