É correto o projeto sobre socorro a bancos em crise
A imprensa atribuiu uma certa conotação negativa ao projeto de lei complementar do governo, que busca modernizar a legislação sobre intervenções no sistema bancário. Para o leitor menos familiarizado com o tema, pode ter ficado a impressão de que recursos dos contribuintes vão ser utilizados para salvar banqueiros.
É um tema difícil de entender, mas a ideia de evitar que uma crise acarrete o colapso do sistema bancário tem sólidos fundamentos. Estudos comprovam que crises bancárias geram queda da atividade econômica, do emprego e da renda, em decorrência da aguda escassez de crédito que provocam. Sem acesso a financiamento para capital de giro e investimento, empresas quebram e geram destruição de postos de trabalho.
A ausência de ação governamental para prevenir tais situações conduz ao desastre. O exemplo mais notável é o dos EUA durante a Grande Depressão. Depois da queda da Bolsa de Valores de Nova York, em outubro de 1929, houve uma corrida dos depositantes aos bancos para sacar seus depósitos, o que gerou seguidas quebras.
O governo interpretou o fenômeno como natural e necessário para depurar o sistema bancário, no qual permaneceriam apenas os bancos saudáveis. Entre 1929 e 1933, faliram 9 mil bancos americanos, na grande maioria estabelecimentos bem administrados. Nem mesmo a melhor instituição consegue sobreviver a uma corrida desse tipo. A quebra generalizada contribuiu para a Depressão.
O governo americano tardou, mas agiu. Criou um sistema de garantia de depósitos com o objetivo de salvar financeiramente os depositantes de bancos falidos. Depois, o Federal Reserva, o banco central, jamais se furtou em socorrer instituições em crise.
O projeto do governo, preparado pelo Banco Central, é resultado de quinze anos de estudos e se beneficia da experiência decorrente do trabalho dos bancos centrais, particularmente os de países ricos, diante da crise financeira de 2008. Incorpora avanços como os de dedicar maior atenção aos bancos sistematicamente relevantes, isto é, aqueles cuja quebra poder ter repercussões mais graves no sistema bancário.
O projeto cria também a figura do “banco ponte” – uma inovação resultante daquele aprendizado –, qual seja a instituição que assume um banco em crise com a missão de saneá-lo, se for o caso, com auxílio do Tesouro, para em seguida transferi-lo a um grupo com capacidade financeira e gerencial para recuperá-lo e devolvê-lo ao sistema bancário.
A exemplo do que é feito em países ricos que socorrem “bancos grandes demais para quebrar” e assim evitar o contágio desastroso para o sistema, o projeto prevê que o Tesouro somente será acionado depois de utilizados recursos dos acionistas e dos depositantes subordinados, cujos recursos serão usados para salvar o banco depositário.
O projeto, se aprovado, vai contribuir para elevar a já alta solidez do sistema financeiro brasileiro, o que é fundamental para o crescimento do PIB, da renda e do emprego.